* Raquel Mendonça
Como em todo primeiro ano de novo mandato, estamos assistindo,
pasmos, estupefatos, desde o início de 2013, a demolição atrás de demolição de
prédios de grande beleza e importância histórica ou cultural para a cidade,
embora não tombados pelo município, mas alguns deles inventariados dentro do
extenso IPAC-MONTES CLAROS - 1º Inventário de Proteção do Acervo Cultural de
Montes Claros, realizado na cidade, com nosso apoio, em 1985, por equipes do
Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais -
IEPHA/MG, nas áreas de história, arquitetura, bens móveis, arte aplicada,
espeleologia e arqueologia ou dentro do próprio Inventário Municipal, que
corresponde a prévio tombamento, o que, em tese, impede descaracterizações ou
demolição!
Nas Ruas Camilo Prates, Dom Pedro II e muitas outras;
Avenidas Coronel Prates (belos e verdadeiros palacetes!...), Av. Francisco Sá e
até mesmo no Núcleo/Entorno Histórico da cidade, como nas Ruas Justino Câmara,
Arthur Lobo e Gonçalves Figueira! E para quê?! Para a abertura de mais um mero
estacionamento, no mais das vezes!...
Belas casas de feições tradicionais ou monumentais vão ao
chão, "anormalmente", nos finais de semana e feriados, como, por
exemplo, da Sexta-Feira da Paixão para o Sábado de nenhuma Aleluia ou
regozijo... No domingo, não existe mais pedra sobre pedra, ou seja, nada mais
resta para contar a história... Agindo assim, na calada da noite ou no silêncio
dos sábados e domingos, evitam fiscalização municipal e impacto imediato junto
à imprensa e população, que amanhece chocada, estarrecida, na segunda-feira,
diante de tanta e tamanha destruição!
Muitas destas demolições acontecem, no mínimo,
"malandramente"! Com relação a algumas casas,
"criminosamente"! O caso de uma destas casas totalmente destruída
parece inacreditável! Foram derrubadas as paredes internas e iniciado até boa
altura o novo prédio - já no segundo pavimento! -, para, só então, serem
jogadas ao chão as fachadas frontal e laterais, o que deixa visível a lastimada
demolição... Quando não é iniciada nova construção ao fundo de edificação belíssima,
extraordinária, que depois, impiedosa e injustificavelmente, desaparece... Em
cada cabeça de proprietário(s), uma "sentença", muitas vezes embasada
na total indiferença, desconhecimento e desvalorização do que, realmente, tem
valor!...
Com a afinal reativação do antigo COMPHAC (Conselho
Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural de Montes Claros),
agora, segundo orientação do IEPHA/MG, Conselho Municipal do Patrimônio
Cultural de Montes Claros - COMPAC, esta questão vem sendo seriamente discutida
reunião após reunião, com a participação de grandes nomes das mais importantes
e efetivamente atuantes entidades representativas da sociedade civil
organizada, como IAB, CREA, OAB, ACI, Corpo de Bombeiros Militar, SINDUSCON,
IHGMC, instituições de ensino superior, como a FASA e FIP/MOC; além de membros
das pastas de Cultura, Educação, Planejamento e Gestão, Infraestrutura e
Serviços Urbanos/Obras, Finanças, Desenvolvimento Sustentável/Meio Ambiente e
ASCOM.
A Gerente de Regularização e Fiscalização de Edificações da
Secretaria Municipal de Obras, que desempenha de forma séria e competente o
mesmo papel anteriormente de responsabilidade da antiga Seção de Uso e Ocupação
de Solo/Divisão de Urbanismo, da então Secretaria Municipal de Planejamento,
nos disse enfaticamente que, infelizmente, não recebeu nenhum pedido de
demolição das casas que foram (ou são), sucessivamente, jogadas ao chão, para
abertura de processo nesse sentido, e que passaria, consequentemente, pelo
nosso setor, para fins de avaliação, caso a caso, casa a casa, e parecer final
acerca da solicitação. Só então seria ou poderia ser expedida pela citada
Gerência de Regularização o necessário Alvará de Licença para Demolição!
Ou seja, há um órgão regulador de demolições na Prefeitura
de Montes Claros, que aprova ou não projetos de construção e demolição, com o
proprietário tendo de notificá-lo sobre a intenção de demolição que, quando
autorizada pelo setor acima, depois da necessária avaliação cultural, é
liberado o devido Alvará!
Um fator importante foi lembrado em reuniões do COMPAC:
muitas, incontáveis edificações da cidade não foram devidamente regularizadas,
ou seja, os documentos formais dão conta apenas da existência do lote, porque a
construção aconteceu ilegalmente, sem que fossem tomadas providências, junto ao
setor competente, para a sua autorização.
Quanto ao "medo" de muitos relacionado ao
tombamento, um instrumento de proteção legal, aplicado através de ato
administrativo ou de reconhecimento do valor e da importância cultural de um
bem (móvel ou imóvel, monumentos, sítios), cuja competência é atribuída, pelo
Decreto-lei nº 25 de 1937, ao poder executivo, ele não implica em alteração ou
cerceamento do direito de propriedade, como pensam muitos, ou seja, a
propriedade não passa à Prefeitura (não se trata de "tomamento"!) e
os seus legítimos donos ou herdeiros podem alugar ou vender a casa tombada
conforme queiram, portanto, nada impede o aluguel ou transações comerciais.
A valorização de um bem imóvel no contexto histórico da
cidade já é, finalmente, menos rara que no passado - passado este ainda
recente, lamentavelmente! -, e muitos são os que hoje têm clara consciência da
importância de preservação e promoção do patrimônio cultural do município; dos
marcos, nas mais diversas proporções ou dimensões, de sua história, em seu
berço histórico ou nascedouro e além dele, enfim, marcos inquestionáveis de sua
memória!
Importante que se destaque, para conhecimento especialmente
daqueles que comumente aparecem, sem a devida informação ou conteúdo correto,
em matérias sobre a séria questão de demolições, o fato de que já está em
tramitação - há alguns meses ou mais, por sinal! - a aquisição, pela Prefeitura
Municipal de Montes Claros, do "Sobrado dos Teles de Menezes",
situado na Rua Justino Câmara, nº 93/Entorno Histórico da cidade, em péssimo (e
perigoso) estado de conservação, para fins de recuperação ou restauração, assim
como o "Sobrado de Dulce Sarmento" (antiga Pensão de Dona Geny
Pereira), na Justino Câmara com Coronel Celestino, conforme Projeto de Lei nº
144/2013, também para fins de restauro e transformação em espaços culturais
importantes, a começar pelo Museu da Imagem e do Som de Montes Claros, cujo
Núcleo (PROMEMOC ou Pró-Memória de Montes Claros, criado pelo grande e saudoso
historiador Hermes Augusto de Paula) já existe em espaço do "Sobrado dos
Versiani-Maurício" (Casarão dos Maurício), localizado na Rua Cel.
Celestino, nº 99/Corredor Cultural Padre Dudu, onde funciona a Secretaria Municipal
de Cultura da cidade.
Nada justifica, assim, a demolição de casas de extrema
beleza, valor histórico/cultural e relevante significado comunitário, para
serem transformadas em nada - nada mesmo! -, muitas vezes! Que seja adquirida e
preservada por quem, na família, tenha informação, sensibilidade e condições
para tal, ou vendida, tal qual é ou se encontra, a pessoas outras não movidas
somente a dinheiro e que não se deixam dominar por especulações imobiliárias ou
medos improcedentes!
Victor Hugo define muito bem e profundamente esta grande e
grave questão: "NÃO IMPORTAM QUAIS SEJAM OS DIREITOS DE PROPRIEDADE! A
DESTRUIÇÃO DE UM PRÉDIO HISTÓRICO E MONUMENTAL NÃO DEVE SER PERMITIDA A
IGNÓBEIS ESPECULADORES, CUJO INTERESSE OS CEGA PARA A HONRA. HÁ DUAS COISAS NUM
EDIFÍCIO: SEU USO E SUA BELEZA. SEU USO PERTENCE AO PROPRIETÁRIO, SUA BELEZA A
TODO O MUNDO. DESTRUÍ-LO É, PORTANTO, EXTRAPOLAR O QUE É DIREITO."
Que se faça, então, em todos os casos e casas, o que é
"direito", e não o que é somente o pobre e diminuto
"dinheiro"!...