por João Batista de Almeida Costa
em quarta-feira 10/01/2018*
Mestre João Farias - Foto Fábio Marçal |
Montes Claros hoje se despediu, com pompa e circunstância catopeísticas, do Mestre João Farias, do Terno de Nossa Senhora do Rosário, com quem, afirmam em sua bandeira, serão felizes!
Fui ao velório na
residência do Mestre João Farias, no bairro Camilo Prates, zona sudeste da
cidade, um bairro de periferia. Fui prestar minha singela homenagem àquele que
em suas andanças como Catopê pelas ruas da cidade nos propiciava, com muita
alegria e encantamento, festejar os nossos Santos de Agosto e a nossa
sociedade, que nos cortejos simbolicamente desfila ante nossos olhos, por meio
de nossa principal festividade cultural. E ao som dos tambores dos Catopês, das
cordas dos Marujos e das cordas e bater das flechas nos arcos o Caboclinhos.
E, estando ali pelo
tempo que me foi possibilitado ficar entendi o pedido do Mestre João Farias
para que o seu velório ocorresse em sua residência e em sua simplicidade
propiciou a nós, que não residimos naquela área, compreender uma outra faceta
dele, do Seu João Batista Farias, ou tão somente Seu João, como a vizinhança se
referia a ele: sua humanidade. Era um homem querido pela população de seu
bairro e vizinhanças que, dando uma simples passada diante de seu corpo inerte,
vestido com a indumentária de Catopê, prestava-lhe reverencia e agradecia em
voz baixa tantas coisas que eles lhes propiciava. Seu João era um homem
“sistemático”, como também era o Mestre João Farias, mas de uma amabilidade,
atenção, carinho, dentro das possibilidades de sua timidez, que oceanava-se em
cada um que a ele recorria.
Vi homens casados,
moços, rapazes que pertenceram ao seu Terno de Catopê, chorando e lhe
agradecendo por momentos que consideravam dos mais felizes e alegres de suas vidas.
Vi crianças dizendo que queria ter sido Catopê no terno de Seu João. Vi e ouvi
muitas coisas encantadoras sobre Seu João Batista Farias.
E, então, compreendi, o
seu desejo de ser velado em sua residência, mostrar-nos a sua humanidade, dado
que nós montesclarenses o conhecíamos como o Mestre de Catopê com sua
elegância, seu ritmo intenso e profundo, sua religiosidade e encantamento com a
Senhora do Rosário de quem era devoto desde criança. E, que, por isto,
tornou-se Catopê. Não vi sua carroça e nem o animal que a puxava. Deve ter tido
um período de descanso, já que o espaço tornou-se ínfimo para tanta gente
simples, periférica, pobre, que a sua casa acorreu. Assim como montesclarenses
conhecidos por seu vínculo à cultura e artes, bem como, por pertencerem a um
dos Ternos de Catopês existentes na cidade. Lá também esteve Padre João Batista
Lopes, companheiro religioso nos festejos de agosto, que fez a encomendação da
alma ao som dos tambores dos membros dos três ternos que lá estavam. Todos
expressando na batida do couro os seus sentimentos, assim, como tantos rezando
as orações que o Padre João comandava. Foi um momento intenso de religiosidade,
de emoção, de sentimentos extravasados e vi homens, mulheres, rapazes, moças,
crianças com os olhos vazados em lágrimas.
A saída de sua
residência ao som da “retirada, a retirada, ê meus camaradas, ê meus
camaradas”, com seu caixão ladeado pelos Catopês perfilados e batendo seus
tambores e cantando as orações que nas Festas de Agosto aprendemos desde
crianças a ouvir e a cantar. E, cantando, oramos aos Santos das nossas Festas
de Agosto. E sobre seu caixão, o lindo capacete que o fazia, aos nossos olhos,
ainda maior, pois em sua religiosidade ele era o homem religioso a nos conduzir
pelas ruas de nossa cidade, em festa à Capela do Rosário.
De sua residência ao
Cemitério Parque da Esperança a falta de gentileza urbana e de respeito humano
dos montesclarenses e do descompromisso da polícia de trânsito, cena que
recorrentemente se repete a cada cortejo e procissão durante as Festas de
Agosto, carros, motos, caminhões, ônibus, carroças, cachorros, bicicletas,
cortando a unidade do cortejo fúnebre e deixando perdidos alguns acompanhantes
de seu féretro. E durante as Festas, quebrando a sacralização do espaço por
onde trafejam os Ternos, os reinados e o império, conduzindo em bandeiras ou em
andores os Santos que nos abençoam, com sua compaixão e misericórdia para
nossas mesquinhez.
E da porta do Cemitério
até o local de sua sepultura, o respeito, a admiração, tocados pela
espiritualidade, tantos e tantas se emocionam ao ponto das lágrimas e, também,
tocados pela força que emana do cortejo que conduz o Mestre João Farias / Seu
João pelos caminhos internos desta Casa que se faz Santa na oração dos membros
dos três Ternos de Catopês! O sol brilha forte, mas a fé, a humanidade, a
admiração e o respeito dos que se fizeram presentes torna o momento um evento
de amplo encantamento tocando o coração e a alma de cada um.
Esteja na Luz Seu João!
Esteja com a Senhora do
Rosário Mestre João Farias!
Permaneceremos saudosos
de sua presença, mas certos de que de onde estás emanará para nós as pétalas da
fé!
*Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Social
Universidade Estadual de Montes Claros