- TÍTULO DE CIDADÃ HONORÁRIA DE MONTES CLAROS:
DRA. ALUISIA
BERALDO RIBEIRO
|
Simião Ribeiro Pires Filho, Aluísia Beraldo, Eduardo Pires e Raquel Mendonça |
A grande e admirada Promotora de
Justiça da 7ª Promotoria de Justiça da Comarca de Montes Claros/MPMG,
responsável pelas áreas de Patrimônio Histórico, Meio Ambiente, Conflitos
Agrários e outras, recebeu, no último dia 25 de maio, no plenário da Câmara Municipal de
Montes Claros, o justo e merecido título de "Cidadã Honorária de Montes
Claros", em super concorrida solenidade! Na foto, Aluísia Beraldo Ribeiro
com esta Jornalista e Gerente de Preservação e Promoção do Patrimônio Cultural, Raquel
Mendonça, e os filhos do saudoso e grande arqueólogo, ambientalista,
historiador e escritor - além de ex Prefeito - Simeão Ribeiro Pires (Simeão
Ribeiro Pires Filho e Eduardo Pires), cujo trabalho e luta pela preservação do
patrimônio ambiental e cultural do Norte de Minas, em especial pelo Parque
Estadual da Lapa Grande, são reconhecidos pela 7ª PJMOC! Autor de "Raízes
de Minas" e outros, Simeão Ribeiro Pires foi um dos fundadores do atuante
Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural de Montes
Claros - COMPHAC, em 1985, junto a Raquel, Virgílio Abreu de Paula e Arthur
Jardim de Castro Gomes.
Abaixo, o belo e brilhante discurso de agradecimento de
Aluísia Beraldo Ribeiro.
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"Saudações...
Escreveu o engenheiro,
ex-prefeito e vereador de Montes Claros, professor e membro da Academia
Montesclarense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais,
o ambientalista Simeão Ribeiro Pires, em sua obra: Gorutuba, O Padre e a Bala
de Ouro:
“É que as terras do SERTÃO eram
distantes, sem leis precisas, difusas que se tornavam pelas lonjuras, vivendo
ao sabor dos grupos familiares, nas grandes ambições dos bens materiais, sem
limites nem fronteiras.
(...)
Sofria o martírio das secas, com
seus rios ainda selvagens nos aguaceiros incontidos, ou então, na visão das
quadras de longas estiagens, desnudos, por inteiramente secos, matizados aqui e
ali com os mosaicos dos beijus colossais na argila fendida.
(...)
Mesmo na vida de hoje, ainda
tranquila nos povoados do Sertão, aparecem, naturalmente, nos encontros alegres
em noites estreladas, os contadores de estórias, ouvidas com grande interesse
pelos mais novos, sob forma de prosa ou até de versos repentistas, ao som das
violas sertanejas.
Nota-se sempre interesse vivo
pelo desvendar do passado, que ainda não se apagou de todo na memória
sertaneja.
(...)
Em verdade, tem razão João
Guimarães Rosa: ‘O SERTÃO é uma enorme espera...’.”
Já no início de minha carreira,
após o exercício de pouco mais de 3 meses na região central de Minas, em São
João Evangelista, no ano de 2004, acabei me titularizando na comarca de
Januária, onde pude conhecer mais de perto a realidade destas longínquas terras
do Estado de Minas Gerais, para onde sonhara, um dia, trabalhar e conhecer
outros sertões.
Desde muito pequena, ainda em
Passos, cidade onde vivi minha infância e adolescência até os 18 anos, sempre
tive em mente que o homem deve ter muitos horizontes, que façam dele um ser
humano destemido e audaz, na busca precípua de sua realização pessoal, ética e
moral para, deste modo, servir à sociedade e marcar, assim, sua trajetória de
vida.
Encorajada por uma paixão: os
livros, acabei optando pelo curso de Direito, que concluí na Casa de Afonso
Pena, pela Universidade Federal de Minas Gerais, no ano de 1996. Residindo na
capital mineira desde 1990 até o ano de 2003, ainda me aventurei na advocacia
criminal, onde pude combater a criminalidade na defesa dos valorosos membros da
gloriosa Polícia Militar de Minas Gerais, para cuja associação de praças advoguei
por quase dois anos.
Servidora pública do Tribunal de
Contas de Minas durante sete anos, dividi minhas funções entre a advocacia e a
dedicação aos estudos e à criminologia, quando me formei criminóloga pela
Academia de Polícia Civil do Estado, abrindo um pouco mais meus horizontes para
a defesa da sociedade, encorajando-me a dedicar, finalmente, ao concurso de
Promotor de Justiça, buscando no combate à criminalidade meu principal objetivo.
Aprovada em 2003, já como
promotora titular na comarca de Januária em 2004, em meio à natureza exuberante
e aos apelos sertanejos do Rio São Francisco, acabei me afeiçoando aos
trabalhos ali exercidos, especialmente às questões ambientais, onde tive
contato com a riqueza e a cultura, mas também com as agruras e o sofrimento do
povo Norte Mineiro.
Durante breve trajetória naquelas
cercanias, acabei atrelando para sempre meu destino e minha vida a essa
afeiçoada terra, onde laços de amor me unem à família que aqui formei, e ao meu
trabalho, ao qual pude me devotar e concretizar meus objetivos, após breve
retorno à capital mineira, onde atuei na região metropolitana, mais uma vez,
auxiliando no combate à criminalidade, tarefa precípua de um promotor de
justiça, cujas raízes primeiras são a identificação com a defesa da vida
solapada pelo crime.
A partir de então, desde novembro
de 2006, exerci nos Montes Claros, que hoje me honra por meio da casa de seu venerável
povo, este valioso múnus do qual fui incumbida quando ingressei na carreira.
Quando um agente do Estado é percebido pela sociedade, por meio de seus
representantes, com o reconhecimento por seu trabalho, essa honraria
destina-se, entendo, não à pessoa, mas à Instituição a que pertence, pelo
exercício contínuo do rol de deveres que lhe impõe posturas como retidão,
equilíbrio e austeridade que marcam sua carreira.
Mas não só de austeridade vive
uma promotoria; nesta jornada pude compreender que o respeito, a cordialidade e
a gentileza devem ser destinados a todos os cidadãos, indistintamente, sejam
eles vítimas ou criminosos, representantes ou representados, reclamantes ou degradadores,
porque na ausência destes sentimentos, o trabalho se torna mais árduo e as
soluções mais distantes...
Padre Antonio Vieira, sempre
atual, talvez hoje mais do que nunca, em seus Sermões, trecho colhido do Sermão
de Santo Antonio, na cidade de São Luís do Maranhão, em 1654, pregava: “Vós,
diz Cristo Senhor nosso, falando com os Pregadores, sois o sal da terra: e
chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra, o que faz o sal. O
efeito do sal é impedir a corrupção, mas quando a terra se vê tão corrupta como
está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual
pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a
terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os Pregadores não
pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar, e os
ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é
porque o sal não salga, e os Pregadores dizem uma coisa e fazem outra; ou
porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que
eles fazem, que fazer o que dizem; ou é porque o sal não salga, e os Pregadores
se pregam a si, e não a Cristo, ou porque a terra se não deixa salgar, e os
ouvintes em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto
verdade? Ainda mal.”
Na espera destes rincões do
Sertão de Guimarães Rosa, aprendi que o sal da terra se espalha com maior
brandura pela bondade do povo Norte Mineiro, muitas vezes por sua carência na
busca de Justiça, ou por sua singela necessidade de ser ouvido e assistido. Foi
então que já há muito tempo, troquei minha antiga paixão pelos livros, pela, nem
sempre fácil, capacidade de ouvir, ouvir as necessidades, as degradações, o
desrespeito e toda sorte de demandas que chegavam à 7ª Promotoria, onde exerci,
com humildade e amor minhas funções, mesmo porque, embora saiba que a Instituição
esteja sempre acima de nossos interesses pessoais ou preferências por
determinados temas, amamos o que fazemos e procuramos ser, pretensiosos, o sal da terra.
Durante estes quase 12 anos em
Montes Claros, atuei, com o auxílio imprescindível e valioso da minha família e
dos meus parceiros, enfrentando com garra e entusiasmo os desafios que me foram
propostos; muitos bem sucedidos, outros nem tanto (ainda), mas todos,
absolutamente todos, com inabalável ternura, sobretudo acreditando que temas como a defesa do meio ambiente
merecem sucesso.
Aprendi a duras penas que a proteção
ambiental dá-se pelas pequenas e óbvias ações e que muito fazemos, se fizermos
um pouco todos os dias, como hábito sagrado: separando o lixo, economizando
água e outros tantos comportamentos para
aquela que considero a única e decente saída para o binômio Humanidade &
Natureza: a educação ambiental.
Roger Scruton, em Filosofia Verde
lança-nos o desafio: “Há uma lição para os ambientalistas. Nenhum projeto de
larga escala terá êxito se não estiver enraizado no raciocínio prático de pequena
escala. Somos nós que temos que agir,
criar consenso e trabalhar em conjunto as decisões tomadas em nosso nome,
fazendo o sacrifício necessário para o bem das futuras gerações. (...)
Precisamos desmontar o global e montar no local, para que possamos identificar
os problemas como realmente nossos, com os meios que podemos controlar e com os
motivos nos quais acreditamos. Isso pressupõe o esclarecimento de quem somos e porque estamos juntos e
comprometidos com nossa sobrevivência. (...) os seres humanos são criaturas de
afeições limitadas (afeições locais), das quais a melhor é a lealdade
territorial, que os leva a viver em paz com os estrangeiros, honrar os mortos e
preparar o terreno para aqueles que os substituirão como inquilinos
terrestres.”
Nesta preciosa lição, curvo-me àqueles
que reconhecem que sem um depurado processo educativo não atingiremos o bem
comum, finalidade intrínseca do Direito e consectário do conceito de Justiça,
dando a cada um o que lhe pertence, na medida em que reconhecemos, como cidadãos,
em primeiro lugar nossos deveres, posteriormente os direitos, para sermos,
então, capazes de respeitar o próximo, inclusive nesta delicada relação homem –
natureza.
Neste equilíbrio reside a
sustentabilidade, sem a qual a humanidade pereceria, ou ainda perecerá, enfim.
Assim, inebriada pelo lisonjeiro
título de cidadã honorária, tenho muito a agradecer, aos edis que me honraram
com tão profundo reconhecimento, por ações que não teriam sido possíveis sem a
participação decisiva de inúmeros atores, que mais uma vez nomeio meus
parceiros. Eles (vocês) são muitos, servidores, colaboradores, integrantes dos
órgãos ambientais oficiais, organizações não governamentais, profissionais e
autoridades, colegas, magistrados, todos de alguma forma envolvidos com a causa
ambiental; cito ainda o cidadão que denuncia, consciente e comprometido e
também o que é denunciado, quem, muitas vezes vi acabar aderindo a esta nobre
tarefa: cuidar, preservar.
Digo-lhes que mesmo que todos estes
parceiros fossem manifestos, esta sintonia que garantiu o sucesso de muitas ações
de preservação não seria possível sem um elemento que reputo inafastável: cada
um de nós, participando deste longo processo de ação e reeducação para
preservar, agiu sim apoiado na legislação vigente, mas agiu, sobretudo, com o
coração. O sentimento que permeia todas as nossas
ações empreendidas, tenham sido elas fiscalizatórias, punitivas, judiciais ou
extrajudicias, de conservação e proteção, foram entrelaçadas com a maior
expressão que o coração poderia nos provocar.
Rui Barbosa define em Oração aos
Moços com maestria o vocábulo: “(...) O coração não é tão frívolo, tão
exterior, tão carnal quanto se cuida. Há, nele, mais que um assombro
fisiológico: um prodígio moral. É o órgão da fé, o órgão da esperança, o órgão
do ideal. Vê, por isso, com os olhos d’alma, o que não veem os do corpo. Vê ao
longe, vê em ausência, vê no invisível, e até no infinito vê. Onde para o
cérebro de ver, outorgou-lhe o Senhor que ainda veja; e não se sabe até onde.
Até onde chegam as vibrações do sentimento, até onde se somem os voos da
crença: até Deus mesmo, inviso como os panoramas mais íntimos do coração, mas
presente ao céu e à terra, a todos nós presente, enquanto nos palpite,
incorrupto, no seio, o músculo da vida e da nobreza e da bondade humana.”
Digo, por fim, a todos aqui
presentes, à minha família, meu marido, (que teve nesta atuação participação
indefectível), minhas filhas, minha mãe, a vocês meus amigos, agradecendo mais
uma vez esta homenagem, que sempre honrarei, como filha adotada, Montes Claros;
onde pude aprender e exercer o árduo e gratificante dia a dia de uma promotora
de justiça, e que o fiz com a razão, sem dúvidas, mas o fiz, sobretudo, com o
coração repleto de entusiasmo e dedicação aos trabalhos que me foram
requeridos.
Muito obrigada! "
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