Por Raquel Mendonça*
AS FESTAS DE AGOSTO E O FESTIVAL FOLCLÓRICO DE MONTES CLAROS:
O PRESENTE COM BOAS LEMBRANÇAS DO PASSADO
Obra do querido e talentoso artista Petter Frank |
"Deus te salve, Casa Santa
Onde Deus
fez a morada
Onde mora o Cálix Bento
E a Hóstia
Consagrada."
Lembrando o grande e saudoso historiador e folclorista,
Hermes Augusto Mendonça de Paula, em seu livro "Montes Claros, sua
História, sua Gente e seus Costumes, considerada "a Bíblia Cultura de
Montes Claros", com pequena atualização e informações complementares:
"Há 180 anos que, nos dias 14, 15, 16, 17 e 18 de agosto - de quarta-feira
a domingo - se realizam em Montes Claros festas religiosas (parte expressiva do
catolicismo popular do município), em honra ou homenagem a Nossa Senhora do
Rosário, santa protetora dos negros; ao santo negro, São Benedito e ao Divino
Espírito Santo, acima de todos os santos, respectivamente. Além das práticas
puramente religiosas, tais como missas, bênçãos e levantamento de mastros,
realizam-se as festas e os lautos almoços - além das Visitas, também às
Famílias Mordomas -, dos Reinados de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito
e do Império do Divino Espírito Santo. Os Catopês ou Dançantes ("mesmo
zumbi ou congado/congada de outros lugares, com belas e ricas características
regionais"), Marujos ou Marujada e Caboclinhos ou Caboclada. Havia, no
passado, as Cavalhadas e o Bumba meu boi, atos que não acontecem há muitos
anos." Com muito brilho e beleza, os Catopês, Marujos e Caboclinhos
realizam o que há de melhor e maior entre os eventos culturais tradicionais,
com destaque ainda para as Folias de Reis e Pastorinhas, pois Montes Claros é
considerada verdadeiro Celeiro de Folias pela Comissão Mineira de Folclore -
CMF, com muitos Catopês e Marujos sendo também Foliões de Reis. Pena que a
importante Associação dos Ternos de Folias de Reis e Pastorinhas de Montes
Claros, por nós criada junto aos ternos, esteja quase que desativada, o que é
lamentável. Tio Pedro Mendonça, grande apoiador das Folias no Bairro de Santos
Reis, lá de cima dos céus, deve estar, no mínimo, muito triste e atento!
Continua Hermes de Paula, o maior defensor das Festas de
Agosto em toda a sua longa história, que abria a sua casa, a famosa
"Chacrinha", situada na Av. Cel. Prates, nº 106, para os parentes e
amigos Festeiros, entre eles nós, pois nossa filha, Ana Bárbara Mendonça, foi
Imperatriz do Divino aos seis anos de idade, Rainha de São Benedito aos nove
anos e Rainha de Nossa Senhora do Rosário, aos 11 anos, em um período em que
havia poucas famílias dispostas a fazer a festa, por devoção ou pagamento de
promessa: "A mais antiga notícia sobre o assunto é datada de 23 de maio de
1839, quando Marcelino Alves pediu licença para tirar esmolas para as festas de
Nossa Senhora do Rosário e do Divino Espírito Santo, que pretendia fazer nesta
freguesia." Depois se associou também às festas a devoção a São Benedito
e, atualmente, são seis os grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos de Montes
Claros, os donos legítimos das Festas de Agosto, coordenada pelo Mestre Zanza
(João Pimenta dos Santos, ou seja, o autêntico Coordenador das Festas de
Agosto), do alto de seus 87 anos de idade e sabedoria: 1º Grupo de Catopês de
Nossa Senhora do Rosário (chefiado pelo Mestre Zanza, com a participação de
filhos e netos no grupo, o que é natural em todos, pois a arte e o ofício de
catopê passam de pai para filho, tendo ao seu lado, na condução do Grupo, o seu
filho, Mestre Zanza Júnior, assim batizado pelo pai, para acompanhá-lo, formado
em Filosofia da Religião pela PUC/RJ, cursando o 8º período de Psicologia nas
FASI, depois de interromper, no 5º período, o curso de Engenharia Civil na
Funorte e do pai recebendo muito de toda a sua sabedoria e rica experiência à
frente das Festas e do Grupo. Júnior participou, recentemente e com brilho, na
Unimontes, de Mesa Redonda organizada e realizada por Raiana Maciel, junto ao
Mestre Zé Hermínio e à Cacicona Socorro. Sobre o Mestre Zanza Júnior, vale
lembrar também que ele chegou ao 4º ano, no Seminário Batista/Instituto Batista
Norte-Mineiro); 2º Grupo de Catopês de Nossa Senhora do Rosário (chefiado pelo
Mestre Yuri Faria, neto do grande e saudoso Mestre João Faria - João Batista
Faria, com a também triste e recente partida de seu irmão Catopê, o querido
Tonão); Grupo de Catopês de São Benedito (chefiado pelo Mestre Wanderley, filho
do grande e saudoso Mestre Zé Expedito - José Expedito Cardoso do Nascimento);
1ª Marujada de Montes Claros, chefiada pelo Mestre Tim (Iderielton), filho do
grande e saudoso Mestre Nenzinho - José Calixto da Cruz; 2ª Marujada de Montes
Claros, chefiada pelo Mestre Zé Hermínio e Grupo de Caboclinhos ou Caboclada de
Montes Claros, chefiado pela Cacicona Socorro, filha do grande e saudoso Mestre
Joaquim Poló... Grandes os nomes das Festas de Agosto, do passado e do presente,
a encherem as ruas de Montes Claros de extraordinária beleza e riqueza
culturais, da Praça Dr. João Alves (Automóvel Clube de Montes Claros),
passando, em seu trajeto ou percurso tradicional, pela Rua Dr. Santos, Praça
Dr. Carlos, Rua Governador Valadares, ao lado do tradicional Café Galo - ponto
de encontro de jornalistas, historiadores, escritores... -, até a Capela do
Rosário/Igrejinha do Rosário ou Igrejinha dos Catopês, com a capela original
tendo sido por eles - catopês, marujos e caboclinhos - construída, incluído o
Mestre Zanza, que começou nas Festas que há décadas coordena, com muita força e
fé, com apenas um ano, como "Catopê de Colo", nos braços do pai
Pacífico Pimenta dos Santos!...
*** Lembrar que, através do Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional - IPHAN, continuam em processo de Registro como Bem
Cultural Imaterial do Brasil todos os grupos de congado ou congadeiros do país,
processo este iniciado por Corina Moreira na cidade, com nossa participação, de
Joba Costa e do Museu Regional do Norte de Minas - MRNM, dirigido com extrema
competência pela muito querida Marina Queiroz, que está criando, com grandes
nomes da cidade, a Associação dos Amigos do Museu Regional...
Durante todo o ano, os Mestres e suas famílias, residentes
nas mais diversas comunidades, fazem ou reformam suas fardas ou uniformes; os
belos capacetes, "símbolo das Festas de Agosto de Montes Claros",
enfeitados com espelhos, aljôfar, fitas de várias cores, penas de pavão - no
passado eram de emas -, os penachos...; consertam ou fazem novos instrumentos
musicais, como pandeiro, viola, violão, rebeca ou rabeca, o violino rústico;
tamborim ou caixa, chama, chocalho... Basta visitar a sede da Associação dos
Grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos de Montes Claros, na Rua Humaitá, nº
126, com Rua Santa Efigênia, no Bairro Morrinhos, presidida pelo Mestre Zanza,
para se deparar com um verdadeiro "Museu do Catopê", com inúmeros e
ricos registros fotográficos de festas do passado e do presente, uniformes ou
vestimentas, capacetes e peças e mais peças doadas por muitos festeiros,
representativas da história das belas e magistrais Festas de Agosto, feitas
pelos Catopês, Marujos e Caboclinhos para todo o povo - o povão, como sempre
diz o Mestre Zanza - de Montes Claros, com apoio da Secretaria de
Cultura/Prefeitura de Montes Claros e da ONG Amigos dos Catopês, Marujos e
Caboclinhos de Montes Claros, criada e presidida pela Catopéia Raquel Chaves
(lembrando que o primeiro Mestre de Catopê a permitir mulheres em em grupo, batizando-as
de catopéias, foi o grande e saudoso Mestre Zé Expedito) , que contribui ainda
com feiras e medicamentos necessários aos mais diversos membros das Festas,
angariando recursos a eles doados, através de promoções organizadas pela ONG o
ano inteiro, tempo que dura a preparação das Festas pelos seis grupos, embora
os Catopês, Marujos e Caboclinhos devessem ser, na verdade, apoiados
financeiramente por mais nomes, empresas, instituições e entidades da
comunidade montes-clarense, porque são muitos os seus gastos e os custos das
Festas de Agosto, com a aquisição de todo o material necessário e confecção de
roupas, acessórios e instrumentos às centenas de seus componentes, vestidos,
ornados e calçados dos pés à cabeça, são muito, mas muito altos e elevados!...
A Prefeitura disponibilizou R$ 9.000,00 para cada Grupo - valor maior até agora
por eles recebido em todos esses anos -, abatidos, naturalmente, e legalmente -
imposto e nota, passando a R$ 7.080,00, com os primeiros R$ 2.360,00 caindo na
conta dos Mestres há três semanas e mais uma parcela na última terça-feira,
faltando apenas o pagamento da última. É hora de a cidade inteira acordar e
ajudar também aqueles que fazem a maior e mais importante manifestação cultural
popular e tradicional de Montes Claros, com 180 anos de existência e
resistência, porque não foram e não são poucas as dificuldades pelas quais
passam, a maioria trabalhando o ano inteiro somente em função das Festas! As
Festas de Agosto pertencem à população montes-clarense!...
"Ah! são chegados os
doze pares
Lá da parte do oriente
Vem dando graças ao Divino
Um senhor tão soberano."
"Lá no céu tem um castelo
Lá no céu tem um castelo, ah!...
Quem formou foi o Rei da Glória
Quem formou foi o Rei da Glória, ah!!...
Filho da Virgem Maria."
"Vamos a ver a barca nova
Ai! Que do céu caiu no mar
Nossa Senhora vai dentro
E os anjinhos a remar."
"A Marujada ou "Chegança", "Chegança dos
Mouros", "Chegança dos Marujos", "Barca",
"Fandango", a teatralização da epopéia da Nau Catarineta, exaltando
os feitos dos marinheiros portugueses e os princípios cristãos da religião
católica, com seus patrões, contramestres, pilotos, calafatinhos e guardas,
seus pandeiros e violas... A roupagem tradicional do passado não se assemelhava
em nada com marinheiros de verdade - calças compridas com babados de renda, uma
blusa enfeitada de aljôfar e rendas, chapéu branco com fita da mesma cor da
roupa e aba "quebrada" na testa. Metade dos marujos se vestia de
cetim vermelho e a outra metade de azul. Atualmente, os dois grupos de marujos
se vestem de forma distinta, definida pelos Mestres. Lembrar ainda as espadas,
o cetro, as máscaras de arame, com olhos, sobrancelhas e bigodes pintados, além
da famosa barca dos marujos... Tudo que foi modificado pelos grupos é legítimo,
o que não pode acontecer são interferências de pessoas que se imaginam donas
das festas do povo... "Inter-ferir" não e nunca, para não comprometer
a tradição, não descaracterizar, empobrecer e, com o tempo e tanta intromissão,
causar até mesmo o desaparecimento das Festas, o que Nossa Senhora do Rosário,
São Benedito e o Divino jamais permitirão!...
"Sou caboco, caboquinho
E não brinco com ninguém
Quando eu pego na minha flecha
Flecho-flecho muito bem (...)"
"Sou cacique, caciquinho
Senhor
lá da mataria
Entre
arcos e entre flechas
Tenho
muita fidalguia."
Os Caboclinhos ou Indiozinhos são "uma folgança de
reminiscência indígena". Com o tempo e as decisões daqueles que têm poder
sobre os grupos, vão acontecendo mudanças, alterações. "O Grupo se
constituía de dez a quinze pares de crianças de 7 a 10 anos, vestidas de
saiotes vermelhos, enfeitados de plumas, com o busto nu, pintado de urucu e
outras tintas, conduzindo arcos e flechas, a cabeça guarnecida por capacete e
penas... O Caciquinho, a Cacicona, o Cacicão, o Papai-Vovô, a Mamãe-Vovó, o
Pantalão, o Capitão Campó... Algumas figuras infantis e adultas permanecem na memória,
mas as que perduram são também acompanhadas por porta-bandeiras e músicos...
Dudu, filho de Joaquim Poló, com o jeito perfeito do pai em tudo, também arrasa
na Caboclada, executando e dançando a música típica dos caboclos...
*** FOLCLORE: FOLK-LORE, SABER DO POVO, COSTUMES, CONJUNTO
DAS TRADIÇÕES DE UM POVO, CONHECIMENTOS OU CRENÇAS, MANIFESTAÇÕES POPULARES, OU
SEJA, "CULTURA POPULAR"...
*** FOLCLÓRICO: RELATIVO OU PERTENCENTE AO FOLCLORE...
"A RETIRADA
A RETIRADA
EH MEUS CAMARADA
EH MEUS CAMARADA..."
ADEUS, ATÉ PARA O ANO...