BUTIQUIM
Entre o universo e as criações humanas, há uma esquina mágica. De
geração em geração, o lugar passa por redimensionamento, inclusive na sua
arquitetura, tomando, é claro, as características e tendências de época, sem,
entretanto, perder o charme. Frequentadores são exponenciais, compondo-se em
gestos, roupagens e termos próprios e o lugar vira uma sequencia de ditames
cósmicos. Parece-me, em meus devaneios bizarros, quase sempre madrugueiros,
constatar a presença de figuras AD ETERNAS, todas imbuídas de suas capacidades
influenciatórias, principalmente através da degustação de um bom vinho.
Naquele momento, consagrava-se um altíssimo papo de línguas soltas e
irreverentes, deixando no espaço suas belezas fulgurantes. Estavam o fogo, a
terra, a água e o ar já envolvidos pela etilidade. Seus argumentos fluíam
naturalmente, sem nenhuma jactância ou orgulho tolo, mas transbordantes de
prazer.
O FOGO recitava sua capacidade de
aquecimento, derretendo a matéria, moldando-a em novas criações. A TERRA
expunha sua doce maternidade num útero sempre grávido de sementes inacabáveis
do bem. O AR cantava seu oxigênio inundador de pulmões do infinito, livrando-os
de impurezas. A ÁGUA escorria lânguida e sensual, aleitando a vida de
criadouros e criaturas. Era, de fato, uma conversa de quatro titãs, para calar
todas as bocas e escancarar ouvidos. De repente, explodida talvez da mente de
algum poeta insone, a libélula pequenina, de pescoço longo e delgado, olhos
dengosos, corpo esbelto de saiote e sapatilhas, linda... Linda... linda e
esvoaçante, dançou uma dança repleta de graça e singeleza, ao ritmo de uma
música divina.
Depois, bem
devagar, perante os quatro elementos, fez uma reverência graciosa e, pelo
sorriso, lhes disse: "OS SENHORES JUNTOS SÃO A PRÓPRIA EXISTÊNCIA".
Eles, flechados nos corações, prostraram-se de joelhos diante daquela centelha
de harmonia e beleza. Com humildade, juraram-lhe amor por todos os tempos, pois
reconheceram que a ARTE é o verdadeiro BEIJO DE DEUS.
* Membro da Academia Montes-clarense de Letras - AML e da
Academia de Letras, Ciências e Artes do São Francisco - ACLECIA