quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

"EIS QUE A VIRGEM RECEBERÁ E DARÁ A LUZ A UM FILHO,
 E CHAMA-LO-ÃO PELO NOME DE EMANUEL." (MT 1.23)


DESEJAMOS A TODOS OS NOSSOS GRANDES E ESPECIAIS 
AMIGOS E LEITORES DO BLOG ARTE E FATOS,
 UM NATAL EM TUDO DIVINO:

CHEIO DE HARMONIA E PAZ!

CHEIO DE POSSIBILIDADES E LUZ!

CHEIO DE ALEGRIA E OTIMISMO!

CHEIO DE FORÇA, SAÚDE E FÉ!...

UM NATAL PLENAMENTE FELIZ!!

E QUE O ANO DE 2020 SEJA REPLETO DE REALIZAÇÕES, 
COM TODOS OS SEUS SONHOS E PROJETOS DE VIDA 
SE TORNANDO REALIDADE!

ANO NOVO, VIDA NOVA, NOVAS CONQUISTAS, 
ESTRADAS E CAMINHOS... 
QUE OS LEVEM VERDADEIRAMENTE 
À FELICIDADE!...

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

- Curso -



- Artigo -

Biografia de “Tuia” -
pelo saudoso Haroldo Lívio*
18/10/2013


'Tuia' pela saudosa amiga Maria de Lourdes

O jornalista Luís Carlos Novaes perguntou-me se eu tinha material armazenado para escrever sobre “Tuia”, que já foi, em passado recente, uma figura mitológica da cidade. Emendando sua pergunta, disse-lhe que o personagem tinha sido meu colega de redação no O Jornal de Montes Claros, onde tinha endereço fixo. É que o diretor do jornal, o saudoso Dr. Oswaldo Antunes, condoído da situação pessoal do preto velho, que peregrinava debaixo de marquises, ao deus-dará, mandou fazer para ele casinha de madeira, tipo casa de cachorro, que foi colocada ao final da varanda, dividindo parede-meia com a redação. Daí, a razão geográfica para ser identificado como colega de redação.

“Tuia”, em toda sua pobreza e humildade, sempre foi assunto para a imprensa, responsável direta por sua celebrização como tipo popular inesquecível. Por ter sido considerado inofensivo, até certo ponto, e também por seu defeito de fala, que não lhe permitia falar mal de ninguém, foi muito focalizado pela imprensa, principalmente pelo órgão que o acolhera como patrimônio da casa.

Foi uma das pessoas públicas mais fotografadas de seu tempo de cidadão montes-clarense, pelas décadas de 1950 a 1990. O querido colunista social Lazinho Pimenta, volta e meia, enfiava seu nome em alguma nota bem-humorada. Sua foto, ora dormindo, de bico, como um bebê, ora de olhos abertos e sorrindo com a boca desdentada, ocupou páginas inteiras, em revistas de prestígio, como “Montes Claros em foco”, do saudoso Ataliba Machado, e “Encontro”, dirigida por Lúcio Bemquerer, que, parece-me, assinou uma reportagem sobre o mito, um homem que nem falava e arrastava-se esfarrapado da redação do O Jornal de Montes Claros até o Hotel São José, seu ponto de almoço.

Um colega de ginásio, Ítalo Colares, que sempre foi grão-mogolense, revelou-me que “Tuia” era seu conterrâneo e que o conhecera por lá, onde tornou-se conhecido como Antonio Preto. Nessa época, o nosso biografado era mais novo e tinha uma condição física melhor. Falava-se, em Grão-Mogol, que poderia tratar-se de um ex-escravo, mas essa afirmação, desprovida de prova documental, não merecia crédito. Porque, para ter sido cativo, ele deveria ter nascido antes de 1870, data da Lei do Ventre Livre, e teria completado 60 anos em 1930. Portanto, pode-se descartar essa versão de que teria sido escravo e aceitar a certeza de que nasceu durante o cativeiro de seus pais.

Em sua terra, quando moço, ganhou a má fama de viver da alcovitagem. Os corações enamorados, com dificuldade para chegar à pessoa amada, principalmente havendo impedimento para isso, encarregavam-no de levar e trazer os bilhetes apaixonados. Num desses episódios de intermediação romântica, foi flagrado como alcoviteiro e tomou uma sova de criar bicho. Diz a lenda que sua língua teria sido cortada, para não revelar os nomes de outros casais a quem servira no leva e traz de cartinhas perfumadas.

Destarte, repudiado por seus patrícios, deixou sua cidade natal e partiu para o exílio em Montes Claros, que o acolheu paternalmente, como é de sua tradição de hospitalidade. Tenho a absoluta certeza de que, em fevereiro de 1953, ele já se encontrava estabelecido por aqui e com jeito de ser morador acostumado ao novo lar. Conheci-o na Pensão São Benedito, em que me hospedava e onde ele também fazia sua refeição diária. Quer dizer, mais uma vez que, antes de sermos colegas de redação, fomos colegas de hospedagem, com muita honra para este escriba.

“Tuia” agia naturalmente até que a pinga de cada dia lhe subisse à cabeça, desde então. Se de barriga cheia, tudo ótimo. Porém, se bulissem com ele, ficava nervoso, pegava o porrete em que se equilibrava e dava pancadas pra todo lado. Embora não conseguisse falar, agredia verbalmente, com grunhidos, que representavam os palavrões mais cabeludos. Era um pornográfico, que dizia obscenidades por gestos e olhares, tudo fazendo crer que não se tratava de um anjo de pureza. Mesmo assim, alguns crentes costumam deixar seu símbolo, o bico de bebê, sobre seu túmulo, no cemitério do Bonfim, em agradecimento por graça alcançada.

Pode, todavia, ter se santificado pela pobreza extrema, pelo analfabetismo de pai e mãe, pelo sofrimento da deficiência física, pela solidão da vida inteira. Ele poderia, muito bem, fazer uma ponta em filme de Charles Chaplin, que o acolheria como um achado e exploraria seu perfil de tristeza e poesia...

* Do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros – IHGMC

- Crônica -

O Roxo Verde decifrado -
 pelo saudoso HAROLDO LÍVIO *
13/10/2013

A origem da esquisita denominação de Roxo Verde, dada a um dos bairros mais antigos de Montes Claros, já foi suficientemente esclarecida por Nelson Vianna, em sua obra “ Serões Montes-clarenses”. Na semana passada, o jornalista Benedito Said, que adora esmiuçar tudo que lhe parece misterioso, veiculou, em sua lidíssima coluna de variedades, no Jornal de Notícias, uma versão que lhe contaram, supostamente explicando o porquê do Roxo Verde. Trata-se de uma deturpação de fato real que, de boca em boca, acabou confundido com o nome do cardeal Richelieu, que entrou de gaiato no caso. Isto costuma acontecer em informações transmitidas apenas pela tradição oral. Diz o velho ditado que quem conta um conto aumenta um ponto.

Nelson Vianna conta que, ali pela década de 1920, aproximadamente, o comerciante José Fernandes de Araújo, de tradicional família da cidade, gostava imensamente de informar-se e de instruir-se pela leitura de jornais, tanto que era assinante do ‘Correio da Manhã”, do Rio de Janeiro. Ele tinha o hábito de, pela tarde, pegar o último jornal recebido e procurar um local aprazível para saborear a leitura. Gostava muito, quando dispunha de maior folga, já que o trabalho o esperava, no balcão de sua casa de negócios, de ir a um recanto bucólico, na saída para Juramento, além da Malhada das Almas, hoje Santuário do Bom Jesus. Ali, à sombra refrescante de árvore frondosa, punha-se a par do que acontecia pelo país e pelos cinco continentes.

Entretanto, o que mais lhe dava prazer era a emoção despertada pelos romances de capa-e–espada, que o matutino carioca publicava em folhetins. Ainda não se falava em rádio e muito menos em televisão, portanto, o folhetim era a novela daquela quadra distante. José Fernandes de Araújo, em seguida à leitura prazerosa, narrava a amigos e familiares as peripécias vividas pelos espadachins e aventureiros. Uma destas histórias fantásticas e rocambolescas o impressionou, particularmente. Era a saga de um tal conde Rochefert, que pintava e bordava em lances de amor e paixão, deixando o leitor empolgado. Por isto, quando alguém indagava por seu paradeiro, os amigos respondiam com segurança e confiança:
_ O Zé deve estar lá no seu cantinho, lendo o Rochefer...

Daí, dá para notar que foi se desdobrando a sequência de corruptelas: Rochefer, Rochever, Rochover, Roxo Verde. Assim, o gabinete de leitura ao ar livre passou a ser chamado por todos de Roxo Verde. Esta é a razão, muito adequada, da existência, naquele local, da Praça José Fernandes de Araújo, que veio a ser o pai do saudoso José Mário de Araújo, o popular Zé Amaro. Quando o fundador do Roxo Verde morreu, colocaram em seu caixão o último “Correio da Manhã” recebido, que ele não pudera ler, para que fosse lido em algum recanto do Paraíso.

Seus descendentes, netos e bisnetos, honram a cidade que muito amou. Um deles, o general Mário de Araújo, é o sexto montes-clarense que recebeu a espada de general das mãos do Presidente da República, há poucos dias. O avô José Fernandes de Araújo adoraria ler a notícia da promoção do neto, em seu jornal preferido, que também já morreu. Não dá nem para imaginar como seria o foguetório e a afobação de Zé Amaro, pai coruja do novo general do Exército Brasileiro.


Para Ray -

RAY COLLARES EM CORES, PROSA E POESIA -
por Raquel Mendonça*




Raio de luz fulgurante
Mais que tudo, desafiante
Nas trevas da infinita imaginação
Tomada de cores, caminhos e conflitos
Onde a dor de existir e desistir, talvez
Fosse detalhe sem maior importância.

Se foi homem ou menino
O menino foi sempre maior e mais forte que o homem
Ora tranquilo, ora atormentado
Ora alegre, ora triste, transtornado
Ora lúcido, ora alucinado.

Mas o menino acabava vencendo todas as batalhas
E o comandava com segurança varonil
Levando-o de volta, docilmente
Aos brinquedos e folguedos de infância.

E dava-lhe ordens mágicas
Dos álbuns de figurinhas
Dos heróis das revistinhas
Aos esplêndidos gibis
Marco na sua carreira
Que ganhou o país e o mundo!

Foi cor e criatividade a mil por hora
Correndo do tom pastel
Das regras e réguas das escolas de arte acadêmicas
Vivendo e professando a mais completa liberdade de ação
De indomável expressão, execução ou composição artística.

Foi ônibus urbano especial, espacial
Que passava voando um após outro à sua frente
Assentado em banco de praça do Rio
Lotado de arte e vanguardismo
Em alta velocidade e vertiginoso talento
Muito tempo adiante de seu tempo.

As faixas laterais se entranhavam inteiramente em sua mente
Perfuravam o seu coração em ato borbulhante de criação
Acabando por explodir nas telas que o tomavam inteiro.

De genialidade desconcertante e torrencial
Varava chuvas, sombras, madrugadas
Banhado de luz, palavras e mais palavras
Nas prosas e poesias sem fim em praças e bares tantos
E tontos de tanta, tamanha inquietude, inspiração profunda.

A dor aguda de viver tão livremente
Não doía indefinidamente
E havia momentos de ser feliz como criança.

Batizado Raimundo Felicíssimo Colares
Felicíssimo por ironia do destino
No caminho cheio de pedras, em meio a trevas
E dolorosos espinhos que percorreu
Pesadas e inesperadas pedras
Pesarosos espinhos!...

RAY
COLLARES

RAY
COR
LARES

TODOS OS LUGARES DO MUNDO
COLARES!...

Um menino?
Um homem?


Um gênio?
Um gigante?!

As faixas fortes e fulgurantes dos ônibus urbanos
Por ele definitivamente reinventadas
Estão entre os brilhos mais intensos de seu trabalho
Transformadas em arte marcante, mais que brilhante.

Da cabeça não lhe saia Mondrian e sua arte mundial...
"Mondrian, Mondrian, Mondrian
Ainda vou entender esse cara
- seu desenho, devaneios, sua coragem e colagem -
como nunca ninguém entendeu!"

Quem nasceu em Grão Mogol, em 1944
Diamante histórico da região
Coberto de areias brancas, pedras e rios tempestuosos
Tinha mesmo que se encantar, em 1986
Precoce, trágica e dramaticamente
No meio de vasto, repentinamente vazio caminho
De quarenta e poucos anos e planos muitos, inacabados.

Foi poeta de aguda sensibilidade
Nos traços fortes de repentina ternura
De preciosa agenda poética perdida
Em mesa de bar
Em banco de praça
Do Rio imenso
Ou esquecida com algum amigo repentino e distraído.

Cristina (era esse mesmo o seu nome?!)
Amiga do Rio que também o acompanhava, como eu, pacientemente
Pelas ruas e luas da cidade
A resgatá-lo semi-vivo de praias áridas e imaginárias, de íntimas tormentas
Catando pedaços, brilhos e cacos, noite adentro
Recolhendo taças e talheres inúteis dos bares bêbados de surpresa
- Sempre a pedido da mãe preocupada e atenta, Dona Joaninha
Que me ligava tantas e tantas vezes, na madrugada -
E eu saia rua abaixo, praça a praça, à sua procura
Com o mesmo carinho de irmã que todo o tempo experimentei
Nestes montes inóspitos e hostis, então, para a cultura, para a arte...

Dono do MAM e do mundo
Percorreu triunfos e tristezas
Recebendo prêmios e mais prêmios
Mais que justos e merecidos.

Experimentou, assim, fartamente
Glórias, angústias e êxtases
Sem se deixar impressionar, no entanto
Ou deter muito tempo
Por nenhum deles.

Nos traços e contrastes gritantes
De sua silenciosa agonia
Ou quem sabe intensa e passageira alegria
Tinha tantas vezes ares de cidadão estelar
Vestindo elegante conjunto de brim caqui
Para, em seguida, mostrar a outra face do seu humor social
E profundo desprezo pela aparência
Comparecendo descalço e de calças dobradas até o joelho
Mangas arregaçadas e fechos descuidados
Ostentando, no andar ereto, nítido descaso
Pelo espanto dos insensíveis e sensatos.

Deixou obras e marcas permanentes por toda parte
Em lares e mais lares de amigos e amigas do peito
De perto ou de longe, morando todo o tempo em sua mente.

"Vou para o Rio ou volto, em março, para Montes Claros?!"
Teresópolis, Niterói, Lisboa, Nova York, Milão, pouco importava...
"O Rio é o Rio, mas Montes Claros é Montes Claros
Montes Claros é o meu lugar no mundo!..."

Dos alagados da Bahia
Cristalizando na tela a tênue sobrevivência humana
Sobre as águas e as ruas paradisíacas e perigosas de Salvador, do Rio
Ou esquinas tentadoras e infernais da Itália
Em seus lixos incômodos e solenemente incendiados.

Lá estava ele, Ray, pura paixão, voando em pincéis e poesia
Ou vivendo os momentos comuns de terna e eterna agonia.

Foi família de grandes figuras e vivência feliz, vezes sofrida
Dona Joaninha, ah, grande e encantadora mãe, Dona Joaninha
Fulô, ô Fulô, a flor que enfeitava a todos - a ele, em especial, amparava
Irmãos Terezinha, Maria Aparecida
Geraldo, Maria do Rosário, a Rosarinha
Jorge Eustáquio, Cassimiro
Fernando, mais que irmão, amigo atencioso
João Ricardo, que se foi muito mais cedo
Grandes quadros no coração guardados
Na mágica poética de seu dia a dia conturbado
Navegando entre a alegria, a dor e a certeza de ser amado!...

Numa das últimas conversas de bar me disse, mais uma vez, coisas e brilhos como os poemas prontos:
"Viver uma só vez/ Viver uma vez/ Viver uma." (...)
"Dia-dor-im/ É a dor/ De Diadorim/ Dentro de mim."(...)
"Sou homem/ Da mesma maneira/ Quero uma mulher/ Um grande amor/ Um filho."

Daí o amor correspondido apenas com a maior e mais pura das amizades!...

Quando ele se foi, fiquei tempos sentindo-o por perto, como se a me proteger,
chegando a ter a nítida sensação de "ouvir" os seus passos me seguindo, os seus braços me amparando
O mesmo que por ele fiz durante anos...

Fiquei como todos inconformada, sofrendo a dor da perda de um amigo
Mais que especial, admirado, querido
Escutando de novo as conversas e confidências no Bar "Kamindicasa"
E tantos e tantos outros...

Mas o que verdadeiramente importa
De todas as portas que enfrentou e abriu
É a arte que fez magistral
Os sonhos que bem ou mal sonhou
Viveu, reproduziu, realizou
O eterno coração de menino
A imensa saudade de todos
Aqui assustados, chocados
Desesperados, desamparados
Quando a alma no coração em chamas!...

E o amor, Ray
Ah, o amor
Todo o amor do mundo para Ray
Grande Ray, Rai-mundo,
como lembrou em seu poema:
"Mundo, vasto mundo
Eu me chamo Raimundo
Sou um poeta, uma rima
Não uma solução!..."

Hoje estrela luminosa no céu
Anjo bom e amigo do infinito!...

Em meio ao silêncio que se fez
O repentino grito!...

* Poetisa, cronista, amiga-irmã do artista.
Membro da Academia Montes-clarense de Letras/AML, da Academia de Letras, Ciências e Artes - ACLECIA e do Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros - IHGMC

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